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maio 15, 2010

Se todos fossem vegetarianos...



A revista Época de 12/06 traz uma entrevista com Paul Roberts, autor do livro The End of Food (O Fim da Comida). Roberts, que é jornalista especializado em economia, tecnologia e meio ambiente, prevê que, até 2050, a demanda por comida ultrapassará a oferta. Um primeiro alerta seria a atual explosão do preço dos alimentos. Leia alguns trechos da entrevista:

Malthus estava certo?
Após 200 anos, é cada vez mais difícil dizer “não” a essa pergunta. Continuamos desenvolvendo novas tecnologias para produzir mais comida, mas enfrentamos novas restrições que os fazendeiros do passado não tinham. Historicamente, a forma de aumentar a produção era expandir a área plantada. Isso é cada vez mais difícil. A maioria das terras aráveis do planeta já é usada e a maior parte do que resta são as últimas florestas. É o caso do Brasil, onde as novas áreas de plantio são obtidas à custa da derrubada de florestas.


O que fazer?
Há três grandes desafios para criar uma Segunda Revolução Verde. O primeiro é o aumento do preço do gás natural, o principal insumo na produção de nitrogênio sintético, que por sua vez é o maior insumo dos fertilizantes. A maior parte do excedente agrícola atual se deve à disponibilidade de nitrogênio barato. Se o preço dos fertilizantes se mantiver elevado, alimentar daqui a 50 anos outros 4 bilhões de pessoas, além dos 6,6 bilhões atuais, será um tremendo desafio. É preciso alternativas para produzir novos fertilizantes.


O segundo desafio é...
A falta d’água. Para isso não existe alternativa. Não há continente onde não falte água. Cada país responde ao desafio de forma diferente. A China está substituindo a produção de grãos, que usa irrigação maciça, pela de frutas e verduras, que consome menos água. Em 2007, importou 30 milhões de toneladas de soja, boa parte oriunda do Brasil. Isso significa que a China está importando de vocês sua água. Está ocorrendo uma mudança no “mercado virtual” de água. Por algum tempo, isso deve contrabalançar a escassez. Mas, no fim das contas, não existe água suficiente no mundo para atender ao aumento projetado na demanda de alimentos.


E o terceiro?
O último é o maior de todos: as mudanças climáticas. Elas vão dificultar o aumento na produção de comida e acentuar a escassez de água. A alteração do clima também será um desafio para que grandes exportadores, como os Estados Unidos e o Canadá, consigam elevar sua produção. Os desafios são complexos e as respostas para eles também. Será preciso reduzir o uso de energia e de água na agricultura, ao mesmo tempo que se elevam a eficiência e a produtividade. Porém, isso não será o bastante. Seremos obrigados a comer menos.


A Terra pode alimentar 2,5 bilhões de bocas com uma dieta ocidental, rica em carne, ou 20 bilhões de vegetarianos. Mas somos 6,6 bilhões...

Se todos se tornassem vegetarianos, ninguém no planeta passaria fome por escassez de comida.
Sei que o 'Planeta' não se pode tornar vegetariano da noite para o dia, isso faria parte de um longo processo. Durante esse tempo, não se gerariam novos animais para abate e assim os existentes se reduziriam em número. Assim como as pessoas que têm seu ganha pão na indústria do abate, ninguém se veria sem emprego de uma hora para outra. 
Vendo as mudanças, os trabalhadores migrariam de uma atividade a outra de maneira natural. Por exemplo: o filho do trabalhador nos abatedouros, em vez de seguir a profissão do pai, opta por aprender o cultivo de determinado vegetal.

A pecuária e a avicultura consomem grande parte da produção de grãos. Tome o exemplo dos Estados Unidos, com um consumo anual per capita de 100 quilos de carne, comparado ao da Índia, com 15 quilos. É preciso elevar o consumo da Índia e desencorajar o consumo nos Estados Unidos e na Europa, para tentar atingir uma média global de consumo mais justa e sustentável.


Isso não é utopia?
É preciso reduzir o consumo de carne. É urgente! A questão é como fazê-lo. 

Nos Estados Unidos não se toca no assunto. Acham que comer carne é um direito eterno. Seu consumo é considerado um índice de prosperidade – apesar dos problemas de saúde, como doenças cardíacas, que seu consumo acarreta.

Em Portugal? No Brasil, é a mesma coisa.

Entre todos os alimentos ao nosso alcance, nenhum é motivo de maior controvérsia do que a carne. A atração por ela vem desde o início dos tempos, com o ser humano afiando lanças para alcançar o que insistia em fugir. Até hoje a carne é o alimento mais valorizado pela maioria das culturas, tanto no interior da África ou da Austrália quanto nas grandes cidades da Europa e das Américas. Tanto assim que a indústria da carne foi a primeira da história, e nenhuma outra ocupa tanto espaço na superfície da Terra. Em compensação, nenhum outro alimento foi tão restringido e proibido quanto a carne. Principalmente pela religião, mas também pela medicina.  Em Portugal comer carne ainda é considerado um estatuto social(?), culturalmente falando, é uma herança (péssima) que nos foi deixada pelos nossos antecessores desde os Descobrimentos, quando a carne era um alimento 'necessário'.
  O Brasil está se desenvolvendo, e a lógica pressupõe que num país bem-sucedido come-se tanta carne quanto se deseja. Para inverter essa lógica, é preciso um líder corajoso e habilidoso. 
Cedo ou tarde, essa discussão terá de ser atacada.

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