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novembro 18, 2007

Vincianos, Damascenos e Relutantes


De acordo com o pensamento do filósofo Tom Regan, relatado no excelente livro chamado “Jaulas Vazias”, existe vários tipos de conversão à causa animal e, consequentemente, ao vegetarianismo ou veganismo. Sim, gosto de utilizar a palavra “conversão”, pois é exactamente isso que acontece com uma pessoa quando ela resolve mudar todo seu estilo de vida por uma causa tão nobre. Portanto, há uma transformação na forma antiga de pensar e uma mudança permanente no seu estilo de vida.
Abaixo resumirei as diferentes formas apontadas por Regan de como a consciência animal é adquirida ou construída ao longo da vida.


Os vincianos

Algumas crianças parecem já nascer com uma consciência animal muito aguçada. Sem que ninguém as ensine, elas conseguem entender a vida interior dos animais sem nenhum raciocínio moral ou científico, apenas são capazes de tornar a vida do “outro” parte da própria vida, criando desta forma um grande vinculo de empatia e de uma amizade expressa pelo respeito e pela lealdade. A relação entre a criança e o animal é a do “Eu-Tu”, e não “ Eu-Isso”.
Como essas crianças precocemente sabem o que elas sabem? De acordo com a explicação de Regan, essa consciência é construída através do relacionamento e do conhecimento do seu amigo animal, sim, amigo, pois é semelhante a uma amizade entre humanos, a qual é pautada no comportamento leal, na proteção e na preocupação com os INTERESSES do outro. E para as crianças vincianas, os animais são seus amigos, e comer um amigo morto é algo impensável, algo que jamais desejariam fazer.
Regan chama essas crianças de vincianas, por causa de Leonardo da Vinci, um grande respeitador dos animais. Segundo alguns relatos, Leonardo adotou uma dieta vegetariana na infância por razões éticas. Existe uma frase famosa que Jon Wynne-Tyson faz atribuição a Leornado, que diz: “Eu repudio o uso da carne desde que eu era criança, e chegará o dia em que homens como eu julgarão o assassinato dos animais do mesmo modo como eles julgam hoje o assassinato dos homens”.
Os vincianos são a minoria entre os defensores dos direitos animais. A maioria das pessoas possui a compreensão dos animais herdada, ou seja, de acordo da forma com que a cultura vê os animais. E o paradigma cultural ocidental em geral vê os outros animais como seres que existem para nós, não tendo outro propósito para estar no mundo se não o de atender às necessidades e os desejos de nós humanos. Assim, os porcos, por exemplo, mostram sua razão de ser ao se transformar em fatias de presunto entre duas fatias de pão.


Os damascenos

As pessoas passam pela mudança de percepção de diversos modos, por diversas razões e em tempos diferentes. O termo dasmasceno é baseado na conversão de Saulo, ocorrida na cidade de Damasco. De acordo com a Bíblia, quando Saulo, até então um perseguidor dos Cristãos, estava caminhando pela estrada de Damasco, Jesus apareceu milagrosamente e conversou diretamente com ele. Isso bastou para mudar a vida de Saulo para sempre.
Os damascenos participam da consciência animal de um modo semelhante. Em um momento eles estão aceitando o paradigma cultural; no minuto seguinte, não estão mais. É um momento de plena transformação na mente e no coração. Regan conta a história de uma menina que cresceu criando um carneirinho. Todos os dias pela manhã ela o visitava, escovava-o, limpava-o e lhe dava comida. Até que um dia, quando ela foi até o celeiro para cuidá-lo, o carneiro não estava mais lá, e no jantar da sua casa foram servidas costelas de carneiro. Desse dia em diante, sua vida ficou plena de consciência animal, e o sofrimento de todos os animais, e não só o do seu carneiro, tornou-se a passagem pela qual ela adentrou ao mundo.


Os relutantes

De acordo com a experiência de Regan, existem mais defensores dos direitos animais damascenos do que vincianos. Quando se trata da forma como nós vemos os outros animais, há mais gente que muda por causa de uma experiência única e transformadora do que gente que nasce com uma empatia natural e nunca mais perde. No entendo, o autor aponta que a maioria dos defensores dos animais é composta por pessoas relutantes, gente que primeiro aprende uma coisa, depois outra; que experimenta isso, depois aquilo, fazendo perguntas, achando respostas, tomando uma decisão, depois outra e outra. Não importa quanto tempo demore, os relutantes avançam para a consciência animal passo a passo, pouco a pouco.

Não importa a forma, o mais importante é evoluir para uma consciência animal em nossa alimentação, vestimenta e entretenimento.

Fonte: Livro "Jaulas vazias"



Uma abordagem dos arquétipos da consciência animal segundo Tom Regan.

Conceitos básicos

* Filosofia: pensamento inicialmente contemplativo, em que o ser humano busca compreender a si mesmo e a realidade circundante, e que irá determinar, em seguida, o seu caráter prescritivo ou prático, voltado para a ação concreta e suas conseqüências éticas, políticas ou psicológicas.

* Ética: parte da filosofia responsável pela investigação dos princípios que motivam, distorcem, disciplinam ou orientam o comportamento humano, refletindo a respeito da essência das normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social

* Moral: cada um dos sistemas de leis e valores estudados pela ética, caracterizados por organizarem a vida das múltiplas comunidades humanas, diferenciando e definindo comportamentos proscritos, desaconselhados, permitidos ou ideais

* Direito moral: aquilo que é facultado a um indivíduo ou a um grupo de indivíduos por força de leis ou dos costumes, de acordo com as normas morais e éticas


Direitos dos animais

* Questão básica: “Animais não-humanos possuem direitos morais, apesar de não falarem, de não pertencerem à espécie homo sapiens, de não terem racionalidade no mesmo patamar que os humanos e de nem mesmo compreenderem o que são direitos morais?”


Aqueles que respondem sim a essa questão são chamados de...

* ... defensores dos direitos dos animais!

DDAs
Portanto, os DDAs procuram:

* se abster do consumo de carnes, ovos, leite e derivados
* não utilizar couro, peles ou lã no vestuário
* boicotar empresas e produtos testados em animais ou com matéria prima dessa origem
* boicotar “esportes” ou outras formas de entretenimento que utilizem animais
* praticar e incentivar a adoção de animais, e jamais a comercialização dos mesmos
* reivindicar criação e execução de leis de proteção aos animais


Alguns filósofos se dedicam a essa questão. Dois dos mais conhecidos na atualidade:

* Peter Singer: australiano, professor da Universidade de Princeton, atua na área da ética
prática.

* Tom Regan: professor da Universidade da Carolina do Norte, atua na área da bioética.


É no trabalho de Regan que focaremos nossa abordagem!

* Seu livro mais recente, e primeiro publicado no Brasil, é Jaulas Vazias
* Nessa obra, Regan divide os DDAs em três categorias, os assim chamados arquétipos da consciência animal.
* Mas o que é mesmo um arquétipo?
* Arquétipo: modelo ou padrão passível de ser reproduzido em simulacros ou objetos semelhantes; idéia que serve de base para a classificação dos objetos sensíveis


Quais são, então, os três modelos de DDAs segundo Regan?

* Vincianos
* Damascenos
* Relutantes


Vincianos

* Consciência animal inata e precoce
* Apresentam, desde cedo, empatia com os animais
* Relação criança-animal do tipo “eu-tu”, e não “eu-isso”
* Nome dado por Regan em homenagem a Leonardo da Vinci (1452-1519)
* Historiador Edward McCurdy: “A mera idéia de permitir o sofrimento desnecessário e, mais ainda, de matar, era abominável para ele (da Vinci).”
* Da Vinci: “Eu te chamaria (homem) de Rei das Bestas, porque as ajudas só para que elas te dêem seus filhos, para o bem da tua goela, a qual transformaste num túmulo para todos os animais.”
* Segundo os relatos, da Vinci adotou uma dieta vegetariana na infância por razões éticas.
* Porém, sua consciência animal ia além da aversão à carne. Interessava-se em entender o vôo e não podia suportar a visão de pássaros em cativeiro.


Damascenos

* Consciência animal adquirida por uma mudança de percepção súbita
* Mudança de percepção não raro associada a alguma experiência “traumática” transformadora
* Nome dado por Regan em referência à visão que Saulo teve de Jesus na estrada de Damasco, a qual levou-o à conversão à fé cristã
* Seis anos depois da crucificação de Jesus, Saulo recebeu a missão: ir à Damasco (capital da Síria) prender os cristãos que encontrasse pelo caminho.
* Então, avistou uma luz no céu que o envolveu em claridade. Caindo do seu cavalo, ouviu uma voz que lhe disse: "Saulo, Saulo, por que me persegues?”
* Ele perguntou: "Quem és tu?". E a voz respondeu: "Eu sou Jesus, a quem persegues. Mas, levanta-te, entra na cidade e será dito o que deves fazer.”
* Saulo levantou-se e, embora estivesse com os olhos abertos, não mais enxergava. Foi conduzido pela mão por um dos companheiros até Damasco.
* Em Damasco, vivia um discípulo de Cristo chamado Ananias, que impôs as mãos sobre Saulo, o qual recuperou a visão e foi imediatamente batizado.


Relutantes

* Consciência animal adquirida paulatinamente, por questionamento contínuo e mudanças de atitude discretas
* Transformação lenta porém sólida
* Uma vez ocorrida, é permanente
* Busca de mais informações a partir de uma primeira
* Ferramentas: literatura filosófica, sites da internet, diálogo com DDAs
* Caso do próprio Regan
* Caso da maioria dos DDAs
* Futuro dos direitos animais: dependência nos relutantes
* Missão dos DDAs: “sair do armário”, abrir-se ao diálogo, divulgar informações etc.


O que importa para os animais não é o que pensamos, mas sim o que fazemos!

O mais importante: vincianos, damascenos e relutantes chegam ao mesmo lugar por caminhos diferentes!

Consciência animal!


"Chegará o dia em que os homens julgarão o assassinato dos animais do mesmo modo como julgam hoje o assassinato dos homens.
Leonardo da Vinci






Fonte: SVBPoA

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