Os direitos dos animais estão sendo cada vez mais discutidos e seus militantes defendem os mais diversos pontos de vista. O sociólogo Roger Yates é um defensor dos animais desde os anos 70 e recentemente se juntou ao abolicionismo, uma das vertentes mais radicais do movimento. O abolicionismo defende o fim de toda propriedade humana sobre os animais e o pacifismo como forma de luta. Ele explicou suas ideias numa entrevista à Galileu:
Sociólogo Roger Yates
Você é um sociólogo. Como a sociologia pode nos ajudar a entender a questão dos animais?
A sociologia nos ajuda a entender como tratamos os animais porque ela olha a sociedade e pensa suas atitudes. Ela olha o modo como as pessoas se adaptam às regras e valores, o modo como somos levados a olhar de modo diferente os humanos e não humanos. Nós ensinamos nossas crianças que é certo usar os animais, mas sem causar sofrimento desnecessário. A sociologia nos ajuda a entender o especismo: por que pensamos que somos mais importantes, por que valorizamos as vidas de formas diferentes.
Então a gente não é mais importante que os animais?
Precisamos ver o quanto racionalizamos nossa importância. Os não humanos querem viver tanto quanto a gente, é um mal matar um animal e há um senso de igualdade quando comparamos nossas vidas. Somos treinados socialmente a resistir a essa ideia e achá-la tola e sentimental.
A resposta então é o abolicionismo?
O abolicionismo está deslanchando, se tornando um movimento substancial nos EUA e na Europa. É uma ideia nova, que existe há uns cinco anos. É diferente dos movimentos dos anos 70, 80 e 90; uma versão radical dos movimentos pelo bem-estar animal e pela libertação dos animais. Por exemplo, defendemos o veganismo, não o vegetarianismo. É um movimento que foi inspirado pelas ideias de Gary Francione.
Quais deveriam ser os direitos dos animais?
Falamos simplesmente de um direito: o direito a não ser uma propriedade. Podemos destrinchá-lo em outros: o direito à integridade, a não sofrer, a ser deixado sozinho sem a interferência humana. Moralmente, devemos lembrar que não podemos ser seus donos. Quando vemos uma árvore, tendemos a pensar que ela é nossa. Isso vem da teologia, porque pensamos que o mundo é nosso, foi dado pra gente por Deus. O que penso é que existem outros seres que têm tanto direito à Terra quanto a gente.
Você disse que é vegan. Por que não um vegetariano?
Nós vemos muito criticamente o consumo de derivados de leite. Há tanto sofrimento numa fazendo de gado leiteiro quanto numa de gado para corte. Um vegetariano que come muitos laticínios está causando mais mal do que alguém que come carne, mas poucos derivados de leite. Acho que isso tem muito a ver com pressão social e amigos. Se você se apresenta como vegetariano, não parece tanto um louco do que quando você é um vegan.
O que você pensa sobre os animais domésticos?
O problema com esses animais é que nós os geramos e selecionamos sua raça. Alguns animais de pedigree não podem fazer sexo, seus olhos caem, têm problemas horríveis de esqueleto por causa de seu formato. Nossa técnica de cruzamento de cães têm causado muitos problemas para eles: cachorros muito pequenos, muito grandes, cachorros que têm problemas de pele. Se você olhar para os animais de pedigree, verá uma situação de pesadelo.
E temos o direito de ser donos desses animais?
Acho que não. Muita gente pensa que nossa relação com os animais é simbiótica e que não há problema, mas a instituição de possuir um animal já é problemática. Eu sei que é uma das questões mais complicadas dos direitos dos animais, porque é um tanto radical. Eu não quero banir nada, quero uma mudança de consciência. É um tanto utópico, os direitos animais são baseados numa mudança cultural.
Devemos fazer o que então? Abandonar nossos cães e gatos?
É obvio que devemos cuidar dos que já existem, mas não deveríamos produzir mais. Você pode dizer que é uma questão de oferta e demanda. Quando a demanda diminuir, a oferta vai diminuir também. Porque a criação de animais virou um negócio, existem muitos criadores por aí.
Mas hoje em dia os cachorros só sobrevivem em convivência com humanos.
É por isso que eles deveriam diminuir aos poucos. É claro que alguns animais até podem existir livremente sem nossa interferência, mas esse não é o caso de poodles e chihuahas. Temos que pensar nesse problema que criamos, e o primeiro passo é mostrar para as pessoas que é um problema.
Qual seria a relação perfeita entre homem e animais?
Precisamos entender que temos responsabilidades com eles, e, obviamente, eles não têm responsabilidades conosco. Devemos respeitá-los como possuidores de direitos. No momento estamos fundando essa nova relação entre humanos e animais, somos pioneiros. Muitas pessoas se frustram com a demora das mudanças sociais. Eu, como sociólogo, entendo que a mudança é geracional. As pessoas têm que estar acostumadas às novas ideias antes de aceitá-las. Meu trabalho é fazer essa fundação, para que os que vierem depois de mim façam seu trabalho.
Porque você foi preso nos anos 80?
Eu era assessor de imprensa da Animal Liberation Front, que se envolveu em uma situação ilegal (parte do grupo passou a sabotar lojas que negociavam peles de animais). Eu não estava envolvido, mas houve um movimento das autoridades de atacar o pessoal da imprensa. Foi uma daquelas situações esquisitas em que aqueles que escreveram sobre situações ilegais pegaram mais tempo de cadeia do que aqueles que as praticaram. É o modo de os agentes lidarem com movimentos mais radicais, tentam silenciá-los. Foi um dos primeiros julgamentos sobre os direitos dos animais.
Você só luta pelos direitos dos animais?
Eu estive envolvido em movimentos tanto pelos direitos dos animais quanto pelos humanos. Sempre me envolvi em movimentos contra o tráfico de humanos e a escravidão moderna, isso é que mais me incomoda. Se as pessoas ainda desrespeitam os direitos dos outros seres humanos, isso explica nossa incapacidade de respeitar os animais.
Fonte: Revista Galileu
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